quinta-feira, 18 de abril de 2013

Avó

 
Apesar do dia a 1.000 à hora, não podia deixar de escrever aqui a lembrança de que o dia de hoje é o dia de anos da minha avó. Li algures que as pessoas só morrem verdadeiramente quando deixam de existir no pensamento das pessoas. Se assim é, é uma mera falácia que a minha avó tenha partido em 2002. Infelizmente foi embora fisicamente e, com o passar do tempo, torna-se cada vez menos nítida na minha memória a cara dela, nos seus últimos tempos de vida (que foram tb aqueles em que já não estava na casa dela). Na casa onde eu fui TÃO feliz. Onde ela me fez feliz.
 
Recordo muitas coisas. A metade do frando que comprávamos no mercado, juntamente com o pão e os tremoços.
Os sacos de plástico que dobravas meticulosamente.
O teu rabicho no cabelo (antes de o cortares).
Os teus 2 travessões em cada lado da cabeça (tb uso 2 ou 4, agora que me lembro, deve ser pela tua influência!)
Os bocaditos de pão mergulhados no açúcar amarelo.
O pão mergulhado em água com açúcar no Verão, naquele jarro vermelho.
As saladas de atum e tomate no Verão.
A renda.
A tua cadeira vermelha.
O teu relógio de corda azul, que guardo religiosamente comigo.
O dia em que me ensinaste a rezar a Salvé-Rainha.
As idas à missa ao sábado.
O dia em que experimentei infinitas vezes o fato da profissão de fé em frente ao espelho do teu quarto.
Os teus lençóis de flanela.
O saco da água quente.
O teu aquecedor de barras.
Regas as plantas com a mangueira pequenita.
Lavar a roupa na ribeira.
As madrugadas em que te levantavas para ir aos caracóis.
Um dia lá muito longe em que foste ceifar erva e me levaste e deixaste a brincar dentro do carro de mão.
O café mokambo.
O chá dentro do termo.
O cheiro a "munha", quando acendíamos a lareira, nomeadamente nas noites frias de sábado em que voltávamos da missa.
O terço que ouvias na RR, numa das tuas salas.
Quando ia fazer a tua árvore de Natal de surpresa.
Quando descia feliz da vida o carreiro desde minha casa, para "passar as férias" contigo.
As batatas que fritávamos ao lume.
O caldo de bacalhau, batatas e arroz que me ensinaste a fazer.
O colorau que punhas na comida.
O sumol de ananás que bebíamos.
As tuas pastilhas Rennie.
As bolachitas de baunilha que a tia Elisa me trazia da Sr.ª Lucinda quando vinha da vila para a Fonte Galega.
A tua televisão branca por fora e com a imagem a preto e branco.
O som da porta de mola que divide a meio da tua casa.
E tantas outras coisas...
 
Onde estiveres, parabéns avó.
Deves saber que ainda choro por ti.
Que me lembro de dizeres que um dia eu quereria entrar na tua casa e tu não estarias. Tinhas razão, não estás e queria muito que os meus dias te voltassem a ter. Queria falar contigo. Queria levar-te a passear. Queria que me ajudasses a ser melhor e mais feliz.
Deves saber que te recordo quase diariamente, com uma saudade imensa, do tamanho do mundo.
Gostava muito que visses a mulher em que me tornei.
Com tanto de ti dentro de mim.

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